quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Gratuidade não se aplica em litigância de má-fé

A 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro entendeu que a lei de assistência judiciária gratuita (Lei 1.060/50) não é aplicável quando houver litigância de má-fé por parte do postulante do benefício. A decisão ocorreu no processo movido contra o Ponto Frio em que a autora, beneficiária da gratuidade de justiça, pedia indenização, a título de danos morais, por ter seu nome negativado. No entanto, foi descoberto que ela realmente é devedora.

Segundo o relator do processo, desembargador Luciano Rinaldi, "o litigante de má-fé não pode ser favorecido com os benefícios da gratuidade de justiça, devendo arcar com o pagamento de todos os ônus sucumbenciais, e não apenas a multa por litigância de má-fé".

Os desembargadores da 7ª Câmara Cível, por unanimidade, acompanharam o voto do relator e condenaram a autora, Vera da Silva, a pagar, além da multa por litigância de má-fé, os honorários do advogado da empresa, reformando de ofício a sentença para afastar a gratuidade de justiça anteriormente deferida a ela.

"Como antes mencionado, a jurisprudência atual informa que a pena por litigância de má-fé não está inserida no rol de isenções previsto no artigo 3º da Lei 1.060/50. Todavia, e ressalvadas as respeitáveis posições contrárias, penso que o postulante inescrupuloso, que atua no processo de forma desleal, não pode ser premiado com qualquer benesse processual, como a isenção dos ônus sucumbenciais. Acredito que esse posicionamento deve ser revisto, como forma de desestimular o ajuizamento de ações irresponsáveis e aventureiras, praticamente a risco zero", destacou o juiz. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-RJ.

Processo 0207592-60.2010.8.19.0001
Revista Consultor Jurídico, 25 de janeiro de 2012

sábado, 7 de janeiro de 2012

Processos absurdos com histórias absurdas não são privilégios tupiniquins...

Lista de causas ridículas causa riso e revolta nos EUA

Por Rafael Baliardo

A Câmara do Comércio dos Estados Unidos, entidade que representa os interesses do setor corporativo no país, abriu um espaço em seu website, no fim de 2011, para que usuários credenciados votassem nos “piores, mais ridículos e pertubadores” litígios do ano, a fim de montar um lista dos “pesadelos do litígio” de 2011.

“Embora algumas desses processos variem do ultrajante para o ridículo, ações abusivas não são motivo de riso”, declarou, ao Legal Times, Lisa Rickard, presidente do Instituto pela Reforma Legal, braço jurídico da Câmara do Comércio dos EUA.

Para quem pensa que a eleição é um mero passatempo de fim de ano, vale lembrar que a Câmara do Comércio dos Estados Unidos está presente na maioria dos casos envolvendo decisões de ampla importância sobre o universo dos negócios nos EUA. A entidade milita abertamente a favor da diminuição do direito dos reclamente nos tribunais, principalmente em ações de classe contra grandes corporações, como foi o caso recente do Wal-Mart na Suprema Corte dos Estados Unidos.

A votação sobre os litígios mais ridículos é na verdade anual, sendo levada muito a sério pelos organizadores. Para o Instituto de Reforma Legal, a lista é uma importante ferramenta de campanha pela causa. “A pesquisa anual dos mais ridículos processos judiciais nos ajuda a lembrar que ações abusivas afetam pessoas de carne e osso, negócios de verdade e podem ainda provocar consequências prejudiciais na vida, no trabalho e mesmo para o crescimento econômico do país”, disse Rickard.

Entre todos os casos listados no site, o vencedor da votação como o mais ultrajante processo na Justiça americana em 2011 foi a ação movida por um sequestrador contra suas vítimas, um casal rendido por ele dentro de sua própria casa. De acordo com o autor da ação, o casal teria descumprido o acordo para ajudá-lo a fugir da Polícia. O reclamante, que está na cadeia, processa o casal atacado por ele e quer US$ 235 mil por quebra de contrato. De acordo com ele, o casal sequestrado teria prometido ajudá-lo a fugir da Polícia em troca de dinheiro.

O tablóide semanal de assuntos da Justiça, The National Law Journal, listou alguns dos finalistas da pesquisa feita pelo Instituto de Reforma Legal da Câmara do Comércio dos EUA em dezembro passado. Entre eles:

• A ação ajuizada por um homem que entrou armado em um bar (a arma era ilegal), se envolveu em um tiroteio e agora reclama na Justiça que não foi revistado pelos seguranças do bar.

• O processo movido por uma mãe da Califórnia contra o mascote-propaganda da rede de fast food Chuck´n´Cheese. Ela alega que os jogos promovidos pelo “ratinho de pelúcia” da cadeia de lanchonetes constituem formas ilegais de jogos de azar. Ela pede US$ 5 milhões.

• Um senhor de 60 anos, processado por discriminar terceiros por conta da idade, solicitou ao juiz que julga seu caso que seja substituído por “ser velho demais” para avaliar adequadamente e com isenção o processo. O juiz tem 88 anos.

• Dois jovens adultos, de 20 e 23 anos, processaram a própria mãe por ela demonstrar explicitamente que tinha um filho preferido, não dar a mesma atenção a todos e, que embora fossem ricos, por presenteá-los apenas com cartões e não com presentes. Os dois jovens também alegam que, uma vez que entraram na universidade, a mãe não enviou um “kit com mimos” até ambos estarem cursando o sexto semestre [Nota: nos EUA, alguns pais costumam preparar, por tradição, kits de sobrevivência, os chamados care package, quando os filhos saem de casa para ingressar na faculdade].

Porém, nem todos riram da lista. Ainda segundo o The National Law Journal, a Associação Americana para a Justiça, que atua do outro lado da trincheira, trabalhando por políticas favoráveis ao direito dos reclamantes, divulgou uma nota repudiando a iniciativa. “Ausente da lista formulada pela Câmara estão as mais de 100 ações ajuizadas anualmente por esta instuição com a finalidade de demolir os padrões de segurança do trabalho e abolir as garantias de proteção ao consumidor”, disse, em nota oficial Michelle Widmann, porta-voz da AAJ.

“Porém quem esperaria menos hipocrisia do grupo de front das corporações, sustentado justamente por dinheiro de recordistas em poluição, pelos bancos de Wall Street e pelas gigantes farmacêuticas”, concluiu.
Rafael Baliardo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.

Revista Consultor Jurídico, 7 de janeiro de 2012

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Bacharéis desestimulam resolução extrajudicial

Por André Luis Melo

Há muito discurso para implantação de resolução extrajudicial de conflitos, mas poucas medidas são tomadas efetivamente. Em regra, são pequenos projetos de resolução extrajudicial de conflitos, pois não há interesse real na implantação dos mesmos. Os operadores do Direito temem a perda de reserva de mercado para esta outra forma de solução de conflito, a qual não é privativa do bacharel em Direito.

Normalmente, são projetos que trabalham com voluntários e, sempre que possível, são processados por práticas “anti-éticas”. As verbas públicas são direcionadas para setores jurídicos tradicionais. E até mesmo municípios e organizações não governamentais são desestimulados a implantarem núcleos de solução extrajudicial de conflitos.

A causa é simples, isto é, canalizar a solução para a via judicial. Afinal, embora o discurso seja que o Direito visa a “paz social”, na prática, é a “guerra processual judicializada” que dá dinheiro. Nas faculdades de Direito decoram todos os nomes de recursos processuais, mas muitos poderiam até ser extintos. No entanto, a complicação processual é o instrumento de poder do bacharel em Direito.

Vejamos a questão do divórcio e do inventário extrajudicial, nos quais de forma paradoxal, é mais barato optar pela via judicial (pois banalizaram a gratuidade da justiça), em vez de optar pela via extrajudicial (pois cartório dificulta muito a gratuidade). Então o Estado banca uma ação judicial que custa em torno de R$ 4 mil e atende aos interesses de setores jurídicos.

Nesse mesmo sentido, a Justiça do Trabalho lutou até conseguir desmoralizar as câmaras de conciliação prévia, as quais embora tivessem problemas, poderiam ter sido melhor regulamentadas. Mas, ao considerar as mesmas como inconstitucionais, em uma leitura equivocada de acesso ao Judiciário e acesso á Justiça, a Justiça do Trabalho ganhou anualmente a criação de dezenas varas trabalhistas, aumento de orçamento e criação de cargos de servidores, embora o trabalhador continue a não receber a sua verba, pois o direito trava na execução (ganha, mas não leva). No entanto, os setores jurídicos asseguraram o seu aumento no orçamento, independente do resultado. Afinal, não basta julgar mais ações, se os direitos não serão pagos na fase de execução trabalhista.

Na prática, os trabalhadores (ou ex-trabalhadores) têm de viajar centenas de quilômetros para ajuizar um pedido trabalhista na vara trabalhista, apenas porque não permitem a regulamentação prevista na Constituição Federal de que pode optar pelo Judiciário Estadual neste caso (artigo 112 da Constituição).

Portanto, os meios de resolução extrajudicial de conflitos, embora sejam uma exigência dos organismos internacionais, no Brasil não conseguem ser popularizados, até mesmo pela banalização da justiça gratuita (que é concedida sem critério objetivo algum, sem fiscalização, não se cobra ao final do processo, nem se comunica ao Executivo os débitos, e atende a médicos, fazendeiros, empresários, servidores públicos e pessoas que poderiam pagar ao final).

O ideal é que os municípios sejam obrigados a criarem núcleos de mediação familiar e outros direitos, além de haver verbas públicas específicas para estes programas. Mas isto não tem apoio das carreiras jurídicas, pois preferem a “guerra processual judicializada”, na qual podem vender seus armamentos e remédios.
André Luis Melo é promotor de Justiça em Minas Gerais, professor universitário e mestre em Direito.

Revista Consultor Jurídico, 2 de janeiro de 2012