Por Líliam Raña
A ação da Justiça tem contribuído para a melhoria da qualidade de vida da população. Mas se o Judiciário não encontrar meios para dar respostas mais rápidas às demandas da sociedade, ele não vai receber o reconhecimento pelo bom trabalho que faz. A opinião é do desembargador Fernando Antonio Maia da Cunha, presidente da Seção de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, o segundo maior colegiado de segunda instância do país.
O TJ paulista cumpriu, até o dia 5 de novembro, 95% da Meta 2, solucionando todos os recursos que deram entrada na corte até 2006. "Pelas nossas estatísticas, vamos cumprir 99% da meta", afirma Maia da Cunha. "Este ano, julgamos muito mais do que o ano passado, e vamos julgar um número de recursos mais de 10% maior do que o de recursos que entraram no tribunal", prometeu, em entrevista à Consultor Jurídico.
O aumento da produtividade da Seção de Direito Privado e de todo o Tribunal de Justiça paulista teve como ponto de partida uma série de providências que culminou com a Resolução 542, de março de 2011. Editada pelo Órgão Especial, a norma definiu estratégias para acabar com o acervo de processos anteriores a 2006 e previu sanções administrativas para aqueles que, injustificadamente, não o fizessem.
Apesar das críticas e da resistência de muitos desembargadores, a cobrança mostrou bons resultados. Em oito meses, 95,2% dos 60.072 processos antigos receberam decisão. O desembargador Maia da Cunha teve influência decisiva na mudança da forma de gestão da corte. Ele sempre foi reconhecido pela metodologia aplicada na administração de seu gabinete, que o levou a zerar o acervo desde janeiro de 2007.
A redução do acervo, aliás, é um desafio constante que Maia da Cunha persegue por meio de estratégias que facilitem e agilizem o trabalho dos desembargadores. Pensando nisso, ele criou o Grupo de Apoio ao Direito Privado (Gapri), que faz todas as pesquisas de jurisprudência que os desembargadores precisam, além de editar boletins semanais. “Só a Seção de Direito Privado não tinha um grupo desses. Era um atraso”, destaca.
Quando assumiu a presidência da Seção de Direito Privado, tinha em seus planos a criação de súmulas que unificassem a jurisprudência. "Até janeiro de 2010,em 130 anos de existência, o Tribunal de Justiça não tinha uma única súmula", diz. Hoje, no entanto, são 62 súmulas só relacionadas ao Direito Privado.
A Seção de Direito Privado corresponde à metade do Tribunal de Justiça de São Paulo, tanto em número de integrantes como no volume de feitos em tramitação nos gabinetes. Com 190 desembargadores, quase 50 substitutos e 10 juízes convocados em três subseções é maior que qualquer outro Tribunal de Justiça do país.
O Conselho Nacional de Justiça “atendeu” a um desejo de Maia da Cunha. O desembargador procurava instrumentos que ajudassem a alavancar a conciliação em segunda instância. O Tribunal já contava, há dez anos, com um núcleo de conciliação, mas este não havia conquistado ainda a importância necessária. "Quando o CNJ baixou a Resolução 125, pensei: 'Isso veio como se eu tivesse pedido'."
Fernando Antonio Maia da Cunha, 60 anos, nasceu em Bauru, criou-se em Adamantina e formou-se em Direito pela Faculdade da Alta Paulista, de Tupã, em 1974. Sete anos depois, foi aprovado no concurso de ingresso á magistratura. Em 2004 foi promovido a juiz do Tribunal de Alçada Criminal e um ano depois, com a Emenda Constitucional 45, passou a desembargador do Tribunal de Justiça. De acordo com o Anuário da Justiça São Paulo 2011, "é um dos expoentes da nova geração de desembargadores empenhados na renovação, inserção e dinamização do TJ paulista."
Também participaram da entrevista os jornalistas Márcio Chaer, Maurício Cardoso e Lilian Matsuura.
Leia a entrevista:
ConJur — No início de dezembro termina o seu mandato à frente da Seção de Direito Privado do TJ-SP. O senhor pensa em se reeleger?
Maia da Cunha — Não. A possibilidade de reeleição existe, pois o regimento não veda. No entanto, na Seção de Direito Privado combinamos que a cada biênio o integrante de uma das subseções preside a Seção. O primeiro presidente foi o desembargador Ademir Benedito da Subseção 2, depois foi o Luiz Antonio [Rodrigues da Silva] da Subseção 3 e agora sou eu, representante da Subseção 1. Então, esta é a vez de um integrante da Subseção 2. A escolha é por eleição envolvendo todos os desembargadores da Seção.
ConJur — E por que não pode haver reeleição?
Maia da Cunha — A reeleição não faz sentido no Direito Privado. Nós somos 190 desembargadores e cada um pode fazer uma nova gestão de motivação, de ampliação e de melhoria. Não há motivo para alguém ficar quatro anos. Eleger a cada biênio o representante de uma subseção mantém a Seção unida. Antes, esta era uma Seção muito separada, porque foi formada por três tribunais distintos.
ConJur — Como foi a união dos três tribunais?
Maia da Cunha — Ela ocorreu com a soma do 1º TAC [Tribunal de Alçada Cível], do 2º TAC e do TJ, na parte de Direito Privado. Levou um tempo para conseguir unificar a Seção e tirar um pouco daqueles interesses personalizados de cada tribunal. Hoje a Seção é bem integrada, mas isto não foi um trabalho meu, foi de toda Seção. A união possibilitou que nós colocássemos no Órgão Especial oito dos 12 desembargadores que são eleitos. Sem as disputas internas, a Seção está maior e melhor, inclusive no relacionamento com as outras Seções.
ConJur — Quais foram os avanços da Seção de Direito Privado?
Maia da Cunha — Por conta desse começo de união dos três tribunais, a primeira gestão, do desembargador Ademir Benedito, ficou muito tempo trabalhando em temas que ainda eram próprios dos três tribunais que se unificaram. Isso tomou muito tempo e, ainda precisou lidar com a proposta de uma unificação de competências, ou seja, misturar tudo que estava formado e fazer novas cinco divisões de competência. Era a ideia de alguns e acabou consumindo grande tempo da gestão do desembargador Benedito, sem que isso tivesse dado certo, pois não era desejo da maioria das três subseções. Depois, o Luiz Antonio administrou a Seção, mas ainda havia outros problemas de três tribunais que igualmente consumiram grande tempo da gestão. As gestões dos meus antecessores ficaram com todos os problemas oriundos da unificação. Prometi que não mais discutiria divisões de competência. Uma vez eleito pela Seção pude, desde o início, aproveitar para cuidar dos 330 mil processos que tínhamos para julgar. Para mim voltar a falar de modificações de competência, naquele contexto, era perda de tempo.
ConJur — Qual foi o foco da sua gestão?
Maia da Cunha — Eu tinha três focos principais. A primeira voltada para tornar os julgamentos mais rápidos na Seção, além de encontrar um modo de resolver os seus problemas, principalmente de atraso nos julgamentos. A equação era difícil. De acordo com dados do CNJ, a produtividade dos desembargadores em São Paulo é uma vez e meia superior à média nacional. Além do que, a distribuição de novos processos não é possível de ser controlada. Antes, quando a distribuição era controlada, o processo levava cinco ou seis anos para ter um relator. Hoje os processos chegam ao Tribunal e são distribuídos.
ConJur — Qual foi sua estratégia para lidar com essa demora?
Maia da Cunha — Com base nessa dificuldade, pensei que nós teríamos de criar alguma coisa entre o desembargador e o jurisdicionado, para que se pudesse julgar mais no mesmo tempo e sem mexer na distribuição. Uma das fórmulas era a edição de súmulas, que não surtem um efeito imediato, mas com o tempo evitam novos processos e facilitam os julgamentos. Em seus 130 anos, o Tribunal de Justiça não tinha súmulas. Em janeiro de 2010, não havia uma súmula no tribunal. Nos 1º e 2º TACs existiam algumas súmulas e o Direito Público tinha alguns enunciados. Trabalhamos diretamente nisso, desde o início da gestão, e temos hoje mais 62 súmulas só das relacionadas ao Direito Privado. O tribunal tem ao todo 75 súmulas, que ainda é pouco, considerando que o Superior Tribunal de Justiça tem mais de 400 súmulas.
ConJur — As súmulas agilizaram e unificaram as decisões do tribunal?
Maia da Cunha — A unificação da jurisprudência é fundamental, mas não dá resultado imediato. A partir da súmula, o primeiro grau passa a utilizá-la para agilizar os julgamentos. Quando chega ao tribunal um recurso baseado na súmula, a preparação desse voto é muito simples, porque a sentença já vem ao encontro do pensamento do tribunal. Isso leva um tempo até se consolidar, mas acredito que hoje já produz bom resultado. Nos últimos anos, também criamos comissões de estudo e jurisprudência de cada subseção e formamos as turmas especiais, que hoje definem os conflitos de competência entre as suas próprias câmaras.
ConJur — Os advogados ainda reclamam da edição de súmulas?
Maia da Cunha — Os advogados reclamaram muito quando se criou no Supremo a Súmula Vinculante e no STJ a Lei de Recursos Repetitivos. Não acredito que isso gere qualquer prejuízo aos advogados e às partes. Pelo contrário. A segurança jurídica, o caminho sobre uma determinada matéria, um determinado entendimento, é fundamental para os advogados, desde a orientação ao cliente até o resultado da demanda, que não pode ser imprevisível quando se trata de questões pacificadas nos Tribunais. As súmulas permitem que cada um possa ter uma ideia muito próxima da realidade do que vai acontecer com o seu processo, caso ele decida entrar com a ação. Aumenta a segurança jurídica e vai diminuir o número de processos no primeiro e no segundo grau.
ConJur — Quais foram as suas outras metas?
Maia da Cunha — O segundo ponto foi a criação do Gapri [Grupo de Apoio ao Direito Privado]. O número de desembargadores é grande e quando eles precisavam de pesquisas de jurisprudência, tinham que pedir na biblioteca, que atendia o estado todo. Era um atraso. O Fórum João Mendes tem o Centro de Apoio aos Juízes há mais de dez anos. As varas da Fazenda Pública contam há mais de 12 anos com o Centro de Apoio aos Juízes da Fazenda. E a Seção de Direito Público também possui, há mais de dez anos, o Centro de Apoio ao Direito Público. Só o Direito Privado não tinha e sua criação foi muito difícil por conta de falta de funcionário, de espaço, etc. Mas, em agosto de 2010, inauguramos o Gapri, com a presença do ministro do Supremo Cezar Peluso [presidente do Supremo Tribunal Federal], que sempre foi do Direito Privado.
ConJur — Como funciona o grupo?
Maia da Cunha — Ele faz todas as pesquisas que os desembargadores precisam, edita boletins semanais e mensais com jurisprudência selecionada da nossa Seção, do STJ e do Supremo e encaminha a cada desembargador por e-mail. Para se ter uma ideia do tempo que perdíamos antes, quando saiu a modificação do Código de Processo Civil, do artigo 475-J, sobre a fase de execução da sentença, os desembargadores todos perderam dois meses estudando a mesma coisa para decidir os agravos. Se tivéssemos o Gapri, ele teria feito a compilação desses dados e encaminhado para os gabinetes. Nós não precisaríamos ter perdido dois meses estudando aquilo que foi, depois, uma conclusão quase unânime. O Gapri envia a todos os juízes de primeiro grau que se cadastraram a nossa jurisprudência atualizada e todos os boletins, o que considero fundamental para facilitar os julgamentos nas duas instâncias. Realizará até o final do ano quase dez palestras para os escreventes e assistentes sobre matérias da Seção, além de ter feito workshops sobre o melhor aproveitamento do SAJ [Sistema de Automação da Justiça] e julgamento virtual. Tem um acervo ainda pequeno de pesquisas temáticas, mas em 2012 investirá nessa área para facilitar o trabalho dos gabinetes. Eu considero que o Gapri foi uma conquista muito importante. Em alguns anos, o grupo será a alma da Seção de Direito Privado.
ConJur — Qual a estrutura do Gapri?
Maia da Cunha — No Estatuto do Gapri, independentemente do coordenador, que será sempre o presidente da Seção de Direito Privado — pois ele tem toda a facilidade de circulação no Palácio no âmbito administrativo —, o grupo tem nove Magistrados, três de cada subseção, sendo dois desembargadores e um juiz substituto. Penso que o Gapri foi uma conquista bem sucedida. Mas, se não fosse esse apoio de todos, dificilmente teria conseguido fazê-lo sozinho. O apoio que recebi durante a minha gestão criou um círculo virtuoso, em que você faz e os colegas vão gostando, e com isso estimulam, contribuem com ideias e sugestões. Isso acaba criando um conjunto muito bom.
ConJur — Quando os integrantes do Gapri se reúnem?
Maia da Cunha — Uma vez por mês, dependendo das circunstâncias. Nos reunimos no final da tarde no gabinete de um dos integrantes do grupo e colocamos a pauta em dia. Geralmente, duram pelo menos duas horas as nossas reuniões .
ConJur — Como é o relacionamento da presidência da Seção com os desembargadores?
Maia da Cunha — Reorganizamos o setor que cuida do processamento dos recursos especiais e extraordinários aos Tribunais Superiores, tendo sido a primeira Seção a assinar digitalmente os despachos de admissibilidade, que são em torno de 250 por dia útil. Com isso poupamos um tempo enorme do presidente, que passou a ser usado em prol da solução dos problemas diários dos desembargadores e juízes, a quem dei tratamento prioritário e urgente, respondendo imediatamente todas as ligações e tentando solucionar de forma rápida todas as dúvidas. Desde pequenas providências a presidência fez o que pode para poupar tempo dos magistrados, inclusive indo aos gabinetes dos colegas para que não precisassem perder tempo de irem ao Palácio solucionar problemas que precisavam ser conversados pessoalmente.
ConJur — Qual foi a terceira meta de sua gestão?
Maia da Cunha — Foi o setor de conciliação de segundo grau, que existe há mais de dez anos no tribunal. Ele foi criado originariamente por desembargadores aposentados que ainda tinham vontade de participar e ajudar. Fizeram isso na conciliação em segundo grau. Muitos advogados colaboraram. Ninguém dava muita importância para o efeito da conciliação na diminuição dos recursos. O setor tinha estrutura mínima, mas a ideia era alavancá-la. Eu pensava nisso há 12 anos, desde a época em que eu trabalhava no Fórum João Mendes. Então, veio a Resolução do CNJ, de 2010 [que dispõe sobre a política judiciária para solução alternativa de conflitos], e pensei: “Isso veio quase como se eu tivesse pedido.” O tribunal ainda tem muita resistência às novidades. Isso é próprio do juiz, e eu me incluo, porque fomos criados nessa concepção de cuidado, de cautela, de prudência, de medo de errar. O medo de errar fez com que o tribunal se atrasasse. Como se fosse tão difícil dizer: “Olha, esse não era o melhor caminho mesmo. Então, fecha-se esse caminho e vamos agora por aqui.”.
ConJur — A Resolução do CNJ ajudou a agilizar a instalação do Centro de Conciliação?
Maia da Cunha — Quando veio a Resolução 125, fui ao presidente Viana Santos e disse: “Presidente, nós temos que fazer isso. E temos que fazer isso em primeiro lugar.” Expliquei que o percentual de acordos na conciliação feito pelo tribunal era de 20%. Isto ocorria na conciliação feita pelos desembargadores e advogados aposentados, por mais de dez anos, que não ganhavam, nem ganham um centavo para o trabalho que desenvolvem com cuidado e zelo. Se tivéssemos capacidade de fazer mil conciliações, faríamos 20% de mil acordos. Fiz um projeto ousado e criamos um Núcleo, que era obrigatório pela Resolução 125, e transformamos o setor de conciliação no Centro Judiciário de Conciliação. E passou a ter a atenção que há muito tempo merecia.
ConJur — Quais foram os obstáculos para instalação do Centro de Conciliação?
Maia da Cunha — Não foi fácil. A nossa resolução, do provimento do Conselho que cria um núcleo e o centro, é de fevereiro de 2011. Estava tudo pronto para funcionar, mas o presidente Viana Santos morreu e, com isso, até a nova eleição, os projetos foram adiados. Inauguramos o Centro de Conciliação em Segundo Grau com a presença da Ministra Eliana Calmon e agora vamos inaugurar as novas instalações, no 18º andar do Fórum João Mendes, com capacidade para 2.500 audiências por mês. Se for mantida a produtividade de 20% de acordos, significa que teremos 500 acordos por mês, 6 mil por ano. Mas a ideia é chegar a 50% de acordos. E, para isto, basta que nós tenhamos o endereço das partes para intimá-las pessoalmente a comparecer na audiência, e não só os advogados. Fizemos testes durante seis meses e chegamos a essa conclusão que ou intimamos as partes ou não vamos melhorar o percentual de acordo. Isso ocorre porque o advogado tem uma série de afazeres e talvez não acredite muito na conciliação de segundo grau. Ainda, ele não consegue tempo para conversar mais com o cliente. Quando você intima a parte, e isso está estatisticamente comprovado, ela vem. Além de querer resolver o problema, quando é feita a proposta ela pensa: “Bom, se eu estou esperando há quatro ou cinco anos, não sei nem se eu tenho direito a mais ou a menos, mas acontece que esse dinheiro hoje para mim é bom.”
ConJur — Quais processos são selecionados para conciliação?
Maia da Cunha — Nós começamos a fazer pelos mais antigos ou por aqueles que manifestam a intenção de fazer acordo. Estamos agora montando a estrutura de informática que vai unificar o estado todo. Nem todas as cidades fazem parte desse sistema unificado. O programa também precisa ser aprimorado, para exigir no cadastro informações como o nomes das partes e o seu endereço. Vamos fazer isso em duas frentes, afinal o tribunal tem hoje 500 mil processos. Quando o processo chega vamos cadastrar o endereço das partes e, quem já usa o sistema integrado com o segundo grau, preenche o endereço lá. Parece simples, mas o impacto operacional é grande pelo número processos — um universo de milhares de processos que chegam todo dia. Incluir essa informação no cadastro, sem correspondente aumento de recursos humanos, acarreta um atraso de 20% na distribuição dos recursos.
ConJur — Como se evitaria esse atraso?
Maia da Cunha — Seria simples e não muito difícil. Basta colocar um funcionário a mais em cada lugar ou 20% a mais. Isto não causaria retardamento da distribuição. O problema é que para colocar funcionários precisa de dinheiro, de verba, de orçamento. Mas não estamos falando de poucos pela grandiosidade dos números de processos que chegam ao tribunal. Há expectativa de que a Secretaria Judiciária seja prioridade para 2012 e com isso poderemos resolver boa parte dos problemas.
ConJur — Qual foi o impacto da conciliação no número de processos?
Maia da Cunha — Nós fazemos 2.500 audiências por mês e se tivermos 40% de acordos, são 12 mil recursos resolvidos por ano. Em cinco anos reduziríamos o acervo em 60 mil processos sem acrescentar trabalho ao desembargador. Estamos terminando a estrutura do sistema, porque não há como desprezar números tão significativos. E é uma pena que não tenhamos visto isso cinco anos atrás.
ConJur — A corte acaba de inaugurar o Centro de Conciliação na Barra Funda. Este não cuidará dos processos da segunda instância?
Maia da Cunha — Não. O Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania cuidará da primeira instância com essa mesma filosofia, de que é uma forma muito produtiva de solução de conflito.
ConJur — A conciliação é, portanto, o caminho para o Judiciário?
Maia da Cunha — Eu acredito que ajuda o jurisdicionado, melhora muito a vida da população, mas não estou certo de que diminui o número de ações. O tempo dirá. Quando formamos o Juizado Especial de pequenas causas, esperava-se que a Justiça comum tivesse uma redução de trabalho. Não aconteceu isso. O Juizado atingiu uma população que era excluída do Judiciário, por vários motivos. Ele achava caro, demorado, precisava contratar advogado, etc. Então, nada do que foi para o Juizado saiu da justiça comum. E pode acontecer que nos próximos dois, três ou quatro anos isso aconteça com a conciliação. Nós vamos fazer lá milhares de acordos e pode não haver redução de ações porque vai atingir um público que não entraria com a ação nem no juizado e nem na justiça comum. São os conflitos menores que o cidadão pensa: “Lá eu vou.” E vai lá, chama a outra parte e resolve. Mas ele não entraria com a ação. Eu tenho a impressão que só daqui cinco ou seis anos, vamos sentir a diminuição da demanda contida, já absorvida.
ConJur — Mas, para a população, vai melhorar, já?
Maia da Cunha — Essa é uma história que faz parte desse contexto, porque o judiciário tem melhorado a vida da população ao longo desses últimos anos. O reconhecimento da população, porém, é mais difícil. Uma das explicações que eu encontro é que a demora impede o reconhecimento da qualidade no judiciário. Nós demoramos muito. Dez anos depois é indecente julgar. Cinco anos depois, essa pessoa fala: “Que bom que reconheceram meu direito. Já deviam ter feito isso há mais tempo”. Eu creio que ou o judiciário encontra uma forma de julgar mais rápido ou, por mais alguns anos, não vamos ter o respeito que nós já teríamos da população se estivéssemos julgando mais depressa. “Justiça e celeridade: a busca da razoável duração do processo”. Penso que este é o nosso grande dilema e o sentimento que hoje está na alma da maioria dos magistrados que integram o Tribunal de Justiça de São Paulo.
Líliam Raña é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 20 de novembro de 2011
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